Simão do Vale Africano

Em todos os dias que passam, Simão do Vale Africano morre, dorme e sonha. Acorda tarde e mal-disposto, talvez porque tenha crescido numa casa de loucos — dito pelo próprio!—, onde se nutriu de humor e beleza, armas inevitáveis contra a tragédia e formas de olhar o mundo.

Habitou o teatro desde muito cedo, mas aquela que parece ser uma incursão recente na fotografia resulta de uma antiga reflexão sobre a captura do tempo ou a materialização visual do nosso processo de percepção.

Com Shakespeare a puxar de uma lado e Jean-Baptiste Mondino a empurrar do outro, encenar e fotografar intersectam-se num certo modo de compor um quadro (tableau), de criar um ambiente, mas também de existir. Num espaço onde luz e cor são moduladas, eminentemente narrativo sem ser diegético e cuja apresentação requer uma qualquer e imprescindível distância, o convite que nos faz é à não interactividade e, sim, à contemplação.

De resto, há alguns anos escreveu-se neste presente, pois é para si certo que a liberdade vem da imaginação. Do impulso imanente da imaginação viva aliada à escrupulosa concretização de domínio consciente, técnicas indispensáveis à escrita de si.

"Capturamos um pedaço de tempo que é quase aleatório, porque não temos a certeza do que é que vai entrar ou não no sensor (ou na película) e tudo passa pela relação com a nossa visão e com a nossa percepção de tempo e de movimento (que mais não é do que o tempo a arrastar-se à nossa frente).

(...) a fotografia era uma forma de purgar de mim alguma coisa, mais do que uma forma de capturar alguma coisa em si, como se de mim passasse para a fotografia.

(...) é como se a cabeça se contasse por imagens, ou mais do que por imagens, por ambientes. Ambientes esses que podem ser representados em cena, numa imagem, noutra coisa qualquer.